Acontece assim... em um dia comum como qualquer outro... ontem estavam lá... hoje lhes viram a face... A amizade, como todas as relações carnais, é frágil... É delicada...
Sei que estas palavras não lhes chegarão aos ouvidos... Mas dizê-las assim... repetidas vezes dentro de mim, talvez amenize o fulgor que banha meu corpo todos os dias ao lhes ver... No café, na TV, nas escadas... Ditas assim, esculpias em epitáfio, findarão meu luto há muito iniciado... Pesar que guardava a esperança humana dos que amam: o regresso da morte. Ah, humanidade que me banha os olhos, o corpo, a alma... só tu para teres esperança... Eu de cá, racional, já antevejo... Ainda que voltem jamais serão os mesmos... Quem do lado de lá caminha não mais por aqui se aninha...
Adeus, e pela última vez, amigos.
A UM AUSENTE
(Carlos Drummond de Andrade)
Tenho razão de sentir saudade,
tenho razão de te acusar.
Houve um pacto implícito que rompeste
e sem te despedires foste embora.
Detonaste o pacto.
Detonaste a vida geral, a comum aquiescência
de viver e explorar os rumos de obscuridade
sem prazo sem consulta sem provocação
até o limite das folhas caídas na hora de cair.
Antecipaste a hora.
Teu ponteiro enlouqueceu, enlouquecendo nossas horas.
Que poderias ter feito de mais grave
do que o ato sem continuação, o ato em si,
o ato que não ousamos nem sabemos ousar
porque depois dele não há nada?
Tenho razão para sentir saudade de ti,
de nossa convivência em falas camaradas,
simples apertar de mãos, nem isso, voz
modulando sílabas conhecidas e banais
que eram sempre certeza e segurança.
Sim, tenho saudades.
Sim, acuso-te porque fizeste
o não previsto nas leis da amizade e da natureza
nem nos deixaste sequer o direito de indagar
porque o fizeste, porque te foste
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